A Amazon e a máfia
A Amazon e a máfia
É incrível o que inventamos para justificar os nossos atos e dar-lhes ar de moralidade perante o público.
A Amazon, para a alegria dos poucos leitores de um país que lê cada vez menos, começou a vender livros físicos no país. A empresa, que já era a referência na venda de ebooks, entra no mercado brasileiro oferecendo livros com descontos tão altos que ameaça o emprego de muitos trabalhadores do setor editorial brasileiro.
O que pensar sobre isso? Os franceses pensaram da mesma forma. Para “proteger a cultura nacional” e as livrarias da França, eles passaram uma “Lei Anti-Amazon”, proibindo a venda de livros com desconto e frete gratuito pela internet. Na Alemanha houveram diversos protestos de autores quando à política de preços da multinacional.
No Brasil a reação, é claro, não foi diferente: a CBL (Câmara Brasileira de Livros), o SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros), a Libre (Liga Brasileira de Editoras), e a ANL (Associação Nacional das Livrarias) todas se manifestaram a favor de uma política de preços fixos para livros, garantindo assim a defesa do mercado brasileiro quanto aos “preços predatórios” da empresa. A situação desse setor não é de penúria, como seus argumentos indicam.
Segundo dados da SNEL e CBL, o faturamento desse segmento da indústria foi de crescimento crescente de 2002 até 2013, indo de 2,18 bilhões naquele ano para 5,35 bilhões neste. Aliás, é de se notar que mesmo com o número decrescente de leitores, o crescimento baixíssimo do PIB e os preços consideravelmente altos do produto, conseguiu-se a façanha de um crescimento de 7% do faturamento do setor em 2013 em relação a 2012 – quando, segundo pesquisa encomendada pelo Ibope, o número de leitores era 9,1% menor do que nos dois anos anteriores.
Mais interessante é um estudo patrocinado novamente pela SNEL, apresentado em 2014 em seminário próprio, onde o sindicato aponta a competição no mercado editorial como um fator que motivaria a cooperação das empresas nacionais para o crescimento da oferta de livros. Logo se vê, então, o caráter do pedido de proteção das organizações brasileiras. Da mesma maneira que as empresas do setor de Comunicação estão dispostas a “competir”, contanto que ninguém mais entre em seu mercado, as empresas brasileiras pedem mais competitividade, através da isenção de vários impostos, e competição quando lhes é sabido que terão seu mercado garantido.
O crescimento do faturamento e a queda do número de leitores nos mostra várias coisas. Primeiro, que há muito demanda que não é suprida por causa dos preços; segundo, que apesar dos preços, o mercado é altamente lucrativo; e terceiro, que se infere dos dois fatos anteriores, que o mercado editorial brasileiro é capaz de competir com o estrangeiro. Tendo em vista esses fatos, deixo em pé uma pergunta: é justo pagarmos a conta de um setor que pode enfrentar a Amazon, mas não quer?
*Guilherme Dalla Costa é Acadêmico de Economia e Especialista do Instituto Liberal.