A CPI pariu um rato
A CPI pariu um rato
Fosse hoje vivo, é o que Horácio, o pensador satírico romano diria sobre a CPI da Covid.
Há mais de 2 mil anos, escreveu ele "a montanha pariu um rato". Com isso constatava algo que no princípio parecia grandioso e a realidade mostrou ser irrelevante.
É exatamente o ocorrido na CPI, que passou seis meses gritando, mirando o governo e prometendo fantasiosas provas de corrupção na aquisição de vacinas e interesses escusos na distribuição dos medicamentos para o demonizado tratamento precoce da Covid 19.
O relatório, lido nesta quarta-feira (20/10), não apresenta sequer um ato de corrupção identificado e, de forma inconvencional, tenta enredar o presidente, filhos e auxiliares num conjunto de frágeis suposições que não resistem a uma analise mais acurada e, em boa parte, ignoram a legislação vigente.
O petardo prometido não passou de um inofensivo e pouco potente traque (conhecido em algumas regiões como bombinha).
A Comissão não cumpriu o objetivo básico de qualquer instrumento apurador. Sem identificar inconformidades ou crimes (conforme prometeram seus integrantes mais afoitos) não conseguiu pugnar no devido tempo por mudanças no enfrentamento da pandemia o que, se tivesse ocorrido, até poderia abreviar fim da mortandade decorrente.
Em vez disso, relator e membros escolheram o midiático caminho da polêmica e do grotesco, desafiando e desrespeitando reconhecidos especialistas, servidores e membros do governo e empresários - uns convocados e outros simplesmente convidados - a depor.
Bastava não falar no sentido almejado pelos inquiridores para ser alvos da grosseria, coação e outros rompantes que não deveriam estar presentes e nem ser admitidos dentro do Senado, a mais importante cidadela do parlamento brasileiro.
Infelizmente aconteceu e aquela casa perdeu excelente oportunidade de ir fundo na questão e propor soluções sustentáveis.
A CPI sequer se interessou pelo destino dado por governadores e prefeitos ao dinheiro federal recebido para combater a Covid.
Poderia, pelo menos, ter enviado expediente às Assembleias Estaduais e Câmaras Municipais, pedindo o rastreio do emprego das importâncias, que são elevadas e em alguns casos se sabe, foram desviadas para pagar precatórios, salários e outras despesas correntes dos governos. Sobra, até, a impressão de que a omissão teria sido atitude deliberada de acobertamento.
Os parlamentares tem o direito – e até o dever – de fiscalizar os atos do Executivo. Uma das formas é a CPI, regulada pelo artigo 58 da Constituição e Regimento Interno do Senado Federal (artigos 145 a 153) mais as leis nº 1.579/1952, 10.001/2000 e 10.679/2003.
Faz parte da gênese das comissões – tanto as permanentes quanto as temporárias – a proporcionalidade partidária ou de blocos parlamentares na sua composição.
Salvo melhor juízo, a CPI da Covid não contempla esse requisito, na medida em que reúne explicitamente opositores ao governo – midiaticamente denominados G7.
Para desfrutar do respeito da população e suas decisões merecerem crédito, qualquer bloco ou comissão apuradora tem de ser – e se não for, pelo menos parecer – imparcial.
Perde desde o início – como ocorreu no presente tema – quando os apuradores ou sua maioria são opositores ou inimigos pessoais do apurado. Fica mais difícil seu trabalho ser levado a sério.
Principalmente quando os acontecimentos são tão ácidos e antiparlamentares. Da forma que foi gestada, a CPI da Covid certamente aprovará o relatório proposto, na votação da próxima terça-feira.
A grande decisão, no entanto, acontecerá no plenário, se é que dentro das fragilidades, o governo, por seus instrumentos jurídicos, não conseguir travá-la antes de ser pautada.
Se não aparecer algum fato concreto e relevante, além daqueles já conhecidos, o caminho mais lógico para o calhamaço de 1000 páginas apresentado como relatório, é o arquivo. Terá o Senado perdido precioso tempo e os recursos despendidos para custear a desastrada apuração.
Haverá o risco de a única consistência restante de toda essa movimentação, estar na indignação do palhaço Pão-de-ló, que se declina membro de numerosa família circense, e, em gravação para as redes sociais, lavrou o seu protesto por não concordar que se chame a CPI de circo e nem seus membros de palhaços.
“Se um senador erra, ele não é um palhaço, é senador; e se a CPI está uma bagunça, ela não é circo, mas o Senado Federal” – conclui o palhaço de verdade.
* Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves é dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).