Lugar de mulher não é onde ela quiser – o novo framing
Lugar de mulher não é onde ela quiser – o novo framing
Raízes antropológicas, culturais e preconceito. A mulher está cada vez mais afastada desse lugar sacralizado pelo mantra hipócrita.
Lugar de mulher brasileira nunca foi e nunca será onde ela quiser, se esse lugar não for um lugar de construção.
Quando eu digo que temos que construir uma posição consolidada e de exercício da cidadania, é porque temos que entregar uma dose elevada de esforços neste sentido.
Impressionavelmente não posso questionar que a anatomia da nossa ascensão, é mais marcada do que nos tempos de minha avó. Ela não pode se divorciar e nem votou até completar 38 anos.
Vivemos tempos em que estudamos, somos eleitores, podemos romper um casamento sem grandes traumas, trabalhamos e temos igualdade constitucional em vários aspectos com o gênero oposto. Podemos ser juízas, deputadas, prefeitas, cirurgiãs de cabeça, coração e pescoço.
Nossa posição de luta é de busca constante por acessos. Para aceder na política, na carreira e em posições tradicionalmente ocupadas pelo homem, temos que estar em constante elaboração.
Chamo de elaborar o processo de modelar comportamentos e atitudes que incluem a construção de blindagens ao ostracismo e ataques consumados do sexo oposto.
É uma posição de resistência. Para avançar temos que atravessar uma faixa, desmilitarizar locais onde se trava a batalha dos sexos. Fugir das granadas.
A postura sexista que tende nos colocar no último lugar da prateleira é ácida. Mas aos poucos avançamos. Quem mais divulga, trabalha e busca dar publicidade e efetividade ao sistema de proteção em torno da mulher é ela mesma. É dela que emana é a própria mulher.
Há aqui uma inversão paradoxal que comprova a distância entre a lei e a força da lei. Não há dúvida que fora das campanhas políticas bem-intencionadas, cheias do desejo de lobotomizar as eleitoras inocentes, esse assunto faz parte da agenda.
Inclusão da mulher. Igualdade. Liberdades. Mas fica só aí. O combate à discriminação em face da mulher, que deveria ser assunto de homem vai sendo dominado pela própria mulher: sempre vítima da segregação.
Não os interessa avançar neste campo. A não ser quando o fetiche da paridade de oportunidades interessa ao homem. Aí viram o slogan. Fora disso, costumamos ser um tipo de incômodo.
E, por isso, de forma travestida, a mulher política, ainda sofre na pele o preconceito, muito evidenciado pelo machismo que corre solto nas duas câmaras do Congresso Nacional.
Claro, há vencedoras. Conheço mulheres que são tratores. Elas desmancharam com energia o machismo e o fizeram com doçura.
Assim, o lugar de mulher, para chegar onde quiser é com muito esforço. É uma batalha que integra não só capacidade intelectual, emocional, como também uma habilidade para lidar com o bicho homem. Inclui cálculo, geometria e psicologia.
Há técnicas e mais técnicas que vão desde a expressão de sentimentos verdadeiros, (de que não desejamos tomar lugar de ninguém); até mesmo habilidade em construir pontes e alianças.
Quando o homem percebe a integridade da mulher, a legitimidade de sua busca, a justiça de seus quereres, e que a questão no fundo, não é tomar lugar de ninguém, apenas acessar oportunidades, costumam nos dar as mãos.
Saímos assim da ilusão perceptual do mantra! Ignorância assumida. Mudança de framing. A mulher vai à luta.
Preconceitos e determinantes antropológicas à parte, as mulheres vivem nesse dispêndio de energia para contratar com o homem. Quando conseguimos são companheiros de salto.
Por sermos minoria em vários campos da vida, inclusive na vida política é que nossos esforços de representação são dobrados.
Vejo uma grande oportunidade para o homem, se fosse macho, em que as causas da mulher estariam no meu caderno de prioridade.
Legislar é algo que no Brasil é indicativo de produtividade parlamentar. Por isso fica aí a dica: legislem temas ou endossem aquilo que trate da mulher. Vamos precisar de vocês para chegarmos onde quisermos.
E neste lugar, seguramente, vocês terão lugar garantido. Nós lhes demos vida, filhos e somos companheiras de um destino marcado por mãos sempre dadas.
Não queremos o lugar de vocês, queremos, estar ao lado. E quem sabe de mãos dadas, nesse palco maluco e de desproteção em que vive a mulher brasileira, vocês nos deixem subir na prateleira!
* Maria Inês Vasconcelos é advogada, pesquisadora, professora universitária e escritora.
Fonte: Naves Coelho Comunicação