Processar marido reduz a violência contra a mulher?
Processar marido reduz a violência contra a mulher?
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, por 10 votos a 1, considerou pública incondicionada a ação penal na hipótese de lesão corporal leve causada em mulher no âmbito familiar e doméstico.
Assim, desde que a polícia tenha conhecimento de que, por exemplo, o marido bateu na esposa, ferindo-a levemente, ainda que contra a vontade da vítima. Cremos que estava com inteira razão o Ministro Gilmar Mendes, que, embora votando com a maioria na decisão do Pretório Excelso, não deixou de observar que em muitos casos a ação penal incondicionada poderá ser um elemento de tensão e desagregação familiar.
Não podemos nos esquecer que, embora seja a mulher o sujeito passiv o imediato da violência doméstica, a objetividade jurídica visada pelo legislador também levou em conta a agregação familiar, bem protegido pela Constituição Federal (art. 126). Suponha-se que o marido, pela primeira vez, sob emoção, fere levemente a esposa em uma discussão, fato testemunhado por um vizinho que o comunica à polícia. Reconciliam-se. Pela decisão do STF, o agressor deverá ser processado. A vítima deporá contra ele? Algum juiz o condenará?
Na maioria dos casos de lesão corporal, segundo a Delegacia de Defesa da Mulher de Bauru (SP), a mulher só procura a polícia para dar um susto no marido Agora, com a decisão do STF, cientes de que não poderão perdoar o marido, teremos menos mulheres reclamando nas delegacias: as violências, entretanto, continuarão.
A violência contra a mulher não pode ser reduzida somente pela lei ou por decisões que, pela relevância, têm força de lei. Educação (políticas públicas) a longo prazo, sistema criminal e Justiça Criminal apropriados são instrumentos eficientes e comprovados. Decidir sobre a natureza da ação penal, aceitando a pública incondicionada e não a condicionada à representação, em nada vai alterar a prática de violência contra a mulher.
Ao contrário, poderá piorá-la.
* Damásio de Jesus é advogado, Professor de Direito Penal, Presidente do Complexo Educacional Damásio de Jesus e Diretor-Geral da Faculdade de Direito Damásio de Jesus.