WhatsApp: A Tecnologia e a Justiça
WhatsApp: A Tecnologia e a Justiça
Pela terceira vez a Justiça brasileira determina o bloqueio do aplicativo de WhatsApp.
A decisão foi proferida pela juíza de Duque de Caxias, justificando que a “empresa não desabilitou a chave de criptografia” para que a justiça fizesse a interceptação do fluxo de dados em “total desprezo pelas leis brasileiras”.
A discussão não é nova, tendo outros juízos de comarcas distintas deferido a mesma medida liminar de bloqueio do aplicativo que fora revogado, quase de imediato, por instâncias judicias superiores.
O bloqueio tem como justificativa o Marco Civil da Internet que permite a interrupção temporária do serviço e prevê a proibição das atividades quando as teles e os aplicativos se recusarem a entregar dados protegidos de usuários quando há determinação judicial até o final do caso.
Sob este enfoque e em exame preliminar parece que a decisão está coerente com os ditames legais. Porém as normas devem ser interpretadas sob o prisma da Constituição Federal e aí surge um conflito, isto porque a Carta Magna em seu artigo 5º, XLVI prevê o princípio da individualização da pena.
O princípio citado não pode ser restrito apenas ao criminoso. A Lei maior dispôs dos princípios e garantias individuais, notadamente no artigo supracitado não necessita tecer todos os detalhes e identificar em numerus clausus as possibilidades de aplicação de casos concretos.
A interpretação jurídica decorre de uma interpretação lógica do próprio direito. Nossa Constituição tem como caraterística um sistema normativo de regras e princípios, sendo utilizados para servir de norma a toda ação jurídica, podendo chamar a atenção para o princípio da razoabilidade, da proporcionalidade assim como a liberdade de expressão e comunicação.
Verifica-se que a decisão que determinou o bloqueio do aplicativo feriu vários princípios Constitucionais, o que levou o Presidente do Supremo Tribunal, em acertada decisão a suspender a liminar deferida pela Justiça do Rio de Janeiro.
A decisão primeira, agora reformada, impôs a restrição da utilização do WhatsApp a milhares de brasileiros que não fazem parte da relação processual, estendendo, por conseguinte, a pena a todos estes usuários. É de bom alvitre explicitar que o bloqueio da ferramenta impede inclusive a atividade jurisdicional, que segundo Lewandowski, tem sido utilizado pelo Poder Judiciário para intimações pessoais.
Acrescente-se que não há estudos que comprovem a possibilidade de a empresa responsável pelo serviço quebrar ou não a criptografia das mensagens, o que por si só demonstra a desarrazoabilidade do bloqueio do aplicativo, conforme ponderou o Ministro.
Acaso comprovado que não exista tecnologia para quebrar a criptografia não haveria descumprimento a ordem judicial, mas a impossibilidade técnica e material de atendê-la, por óbvio. O bom senso deve imperar nas decisões judiciais através da interpretação da legislação em consonância com os princípios constitucionais, evitando-se, assim, a desproporcionalidade e desarrazoabilidade dos atos judiciais.
* Bady Curi Neto é advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG).