Por aqui, Cachoeira é meu louro!
Por aqui, Cachoeira é meu louro!
Está tudo muito bem... está tudo muito bom! E o Brasil segue sua extraordinária trajetória bandida, ostentando o título de celeiro mundial da corrupção.
Basta tentar observar – e só tentar, porque é impossível conseguir por completo! – os tentáculos do contraventor Carlinhos Cachoeira abraçados à política nacional e você terá uma excelente perspectiva da certeza de impunidade que assola o país. Pior: ao longo do último século, as “otôridades” brasileiras fizeram muito mais que corromper e corroer o Estado. Com o apoio da imprensa e da cômoda ignorância massificada, conseguiram colar a ideia de que a corrupção acontece de forma isolada nas instâncias de governo e poder.
Evasivos, os canalhas nacionais chancelaram a compreensão de que os desvios políticos não são regras, mas apenas meras exceções. Qualquer tentativa de relacionar as bandalheiras entre si acaba sendo jogada na vala dos preconceitos e das teorias de conspiração.
A relação criminosa de Cachoeira com o poder é prova inconteste dessa desvirtuação de raciocínio. Observe comigo: uma empreiteira, só nos últimos 10 anos, conseguiu elevar seu patrimônio em 1.653%; só no ano passado (2011), recebeu do Governo Federal quase R$ 1 bilhão por supostas obras e prestação de serviços, tornando-se o maior nome do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que tem como pai o ex-presidente Lula da Silva e mãe-adotiva a atual presidenta Dilma Rousseff; além disso, essa empreiteira celebrou contratos milionários com prefeituras de capitais e governos estaduais, onde se pode destacar Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Bahia, Paraná e o Distrito Federal.
Hoje, atendendo interesses pseudopolíticos de uma turminha de pela-sacos mamateiros, a Polícia Federal promoveu um vazamento seletivo de grampos telefônicos onde um sacrossanto senador oposicionista é flagrado em centenas de conversas-bandidas com um bicheiro; num desses bate-papos, o parlamentar – que era do DEM – foi requisitado a intervir junto a uma prefeitura goiana do PT para liberar o pagamento de R$ 12 milhões. Mas preste atenção: um contraventor pede a interferência de um senador para garantir o pagamento da dívida de uma prefeitura com a supramencionada empreiteira.
Em outro lance, um famoso governador pede emprestado o jatinho do homem mais rico do Brasil para dar um pulo no paradisíaco litoral baiano. Talvez tenha optado pelo antiético favorzinho, ao invés de usar aeronaves oficiais, porque precisava esconder do respeitável público o motivo de seu passeio: a festa de aniversário do dono da tal empreiteira, que em seu governo, assim como no PAC, é a número um na execução de obras públicas. O aniversariante colocou até um helicóptero à disposição de seu ilustre convidado.
Numa das baldeações, a aeronave caiu e o povão acabou tomando ciência do troca-troca. O governador, para sacanear a massa, anunciou a promulgação de um novo código de ética para os funcionários públicos em suas fronteiras estaduais. Voltando um pouco mais no tempo, em 2004, o principal assessor do ministro-chefe da Casa Civil de Lula da Silva, foi flagrado cobrando propinas de Carlinhos Cachoeira para abastecer o caixa-dois do PT e de alguns partidos políticos da então base aliada do presidente da República, dando início ao maior escândalo de corrupção da história recente.
Por essa época, as fotos oficiais já registravam a amizade-colorida entre todas as partes. Sorridentes, num provável deboche nacional, lá estão o presidente, o governador, os parlamentares e o empreiteiro. Só não está o contraventor, porque bicheiro só coloca a coroa diante das câmeras nos desfiles das escolas de samba. O problema é que esse imbróglio de safadezas é propositalmente salpicado na imprensa de forma a figurar como fatos isolados, com o objetivo de falsear uma desconexão.
Não por acaso, os grampos da Polícia Federal também revelam que o contraventor era um dos principais informantes dos dois maiores veículos de comunicação do país, onde plantava notícias de acordo com seus interesses e o desejo de seus nobres associados. Não se engane: nenhuma CPI pretende investigar essas conexões amplas. Cachoeira é só o urubu dessa palhaçada chamada Brasil. Aliás, urubu não. Por aqui, Cachoeira é meu louro!
*Helder Caldeira é escritor, jornalista político, palestrante e conferencista.