Modelo confessional pode criar intolerantes religiosos
Modelo confessional pode criar intolerantes religiosos
A fé é individual; é um processo de escolha, não de imposição.
O Supremo Tribunal Federal entendeu que os alunos de escolas públicas podem ter ensino religioso ligado a uma confissão específica – uma decisão que representa um retrocesso e um atentado ao caráter laico do Estado proclamado em todas as Constituições republicanas.
Essa laicidade significa que o Estado deve permanecer neutro frente às igrejas e aos cultos religiosos, de modo a garantir a ampla liberdade de credo de seus cidadãos. Estabelecer que uma confissão possa fazer proselitismo abrirá as portas para a intolerância que discrimina pessoas e professa outros credos ou confissões.
Pela tese vencedora no STF, as escolas devem adotar o modelo “confessional”, ou seja, a escola escolherá uma religião específica e deverá seguir sua perspectiva, princípios e valores. Os professores de ensino religioso serão representantes dessa confissão com liberdade para influenciar os alunos.
É verdade que as aulas serão facultativas, não obrigatórias. Mas esse modelo trará problemas. Imaginemos que uma escola resolva adotar o ensino religioso de uma denominação neopentecostal, por exemplo. O que acontecerá com alunos católicos ou mesmo de outras denominações evangélicas?
Na certa serão discriminados ou sofrerão bullying por parte dos colegas. O mesmo acontecerá se o catolicismo for a religião a ser ensinada. Pelo bem da democracia, ensino e fé não devem se misturar. Durante as quatro sessões plenárias do STF, venceu a tese de que o ensino religioso não fere a laicidade do Estado e de que não se pode atuar contra as religiões na esfera pública.
Mas é justamente a laicidade do Estado que garante a liberdade de escolha de cada cidadão e suas famílias. As escolas públicas falam para todos e não apenas para os filhos de católicos, espíritas ou protestantes. Seria impossível ao governo contratar professores de cada uma das 140 religiões catalogadas no Brasil. E o que dizer sobre os que não professam nenhuma religião?
O ideal, portanto, já que se quer falar de religião para os jovens, seria praticar o pluralismo religioso, mostrando a história, as doutrinas, práticas e dimensões sociais e éticas das diferentes crenças do país, assim como as do ateísmo e do agnosticismo.
Assim, seria desenvolvido nos jovens o respeito e a tolerância por todos os tipos de religião, não discriminando ou excluindo nenhuma delas. A fé é individual; é um processo de escolha, não de imposição.
Não cabe a ninguém querer nos dizer no quê deveremos crer ou não crer. E por favor, não venham impor crenças – sejam elas quais forem – aos nossos jovens. Vamos dar a eles conhecimento amplo, vamos ajudá-los a promover o livre debate de ideias e crenças.
Dessa forma, estaremos promovendo algo comum a várias confissões religiosas – a ética e o respeito ao ser humano –, bem como a tolerância, valor maior de qualquer país que preze a democracia e os direitos humanos.
* Luis Antonio Namura Poblacion é Presidente do grupo Vitae Brasil.