Portal O Debate
Grupo WhatsApp

A penhorabilidade do imóvel do fiador em discussão

A penhorabilidade do imóvel do fiador em discussão

25/02/2021 Moira Regina de T. Bossolani e Leandro Ibagy

No último dia 19 foi noticiado que o STF decidirá até 4 de março se a questão da penhorabilidade do único bem imóvel do fiador em contrato de locação comercial será novamente reapreciada em repercussão geral.

Aqui não se pretende abordar as teses jurídicas acerca do tema ou ainda relembrar que esta questão em 2010 já foi alvo de decisão proferida pelo pleno do mesmo órgão.

Na ocasião se sedimentou os inúmeros julgados da Corte após a análise do RE 407.688/SP sob a batuta do Min. Cesar Peluzo.

Pelo julgado inicial e a sua majoritária corrente, em 2010 o STF patrocinou o tema 295 norteando ainda mais a interpretação quanto a viabilidade da penhora do bem único do fiador, por sua constitucionalidade, firmando tema sem qualquer distinção de ser sua origem derivada de locação comercial ou residencial.

Aliás, sempre vale registrar que o leading case do tema 295 junto ao RE 612.360/RS sob a relatoria da Min. Ellen Gracie, deu-se em sede de locação comercial.

Mas, repita-se,  aqui não será o palco para discussão técnica, mas, uma observação à vida real e os impactos que uma indesejada revisão irão impactar neste importante segmento econômico.

Veja-se que para viabilizar a reapreciação da matéria, foi eleito pelo Supremo Tribunal Federal, um leading case, o RE1307334 derivado de julgado realizado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, cujo caso concreto de origem representa com exatidão a praxe e precisa ser resgatado.

Trata-se de uma locação comercial, na qual foram seus fiadores os seus respectivos sócios. A mesma pessoa que assinou o contrato como fiadora, assinou também como locatária, visto ser a administradora da empresa.

Isso não surpreende, visto que já se apurou em recente pesquisa do tipo "sondagem em nível Nacional", num universo de cerca de 20.000 mil contratos comerciais, verificou-se que dentre as de menor porte, com valor médio de R$ 3.377,00 (três mil trezentos e setenta e sete reais), 78% delas eram garantidas por fiadores e dentre essas mais de 90% contam com os sócios na condição de garantes da relação locatícia.

A constatação é simples e o lógico objetivo é minimizar os custos da jornada econômica da empresa e maximizar o emprego dos recursos financeiros na própria atividade.

A fiança é a única modalidade gratuita prevista em lei. As demais modalidades, na seara comercial, irão impor um custo adicional médio de 1,5 a 2 aluguéis ao ano.

Pois bem, voltando ao caso concreto em discussão, o contrato de locação fora firmado em dezembro de 2016, para ter vigência por pelo prazo de 36 meses, que se encerraria apenas em 2019, sendo que em Fevereiro de 2018 a locatária deixou de pagar os alugueres, o que deu causa a respectiva ação de despejo por falta de pagamento.

O fato que merece destaque é que os fiadores do caso em tela, como sói acontecer em expressiva maioria de mercado, eram da mesma forma os comerciantes que vieram a inadimplir.

Na ação de despejo por falta de pagamento não apresentaram contestação, mas, no momento da execução trouxeram o tema da impenhorabilidade à tona.

Ou seja, no momento da contratação, estavam lá obtendo as vantagens de serem seus próprios garantes otimizando a locação, mas, com a ciência do seu lastro patrimonial.

No instante que não prosperaram na atividade se arvoram em não cumprir a obrigação pactuada e a lei, visto que a penhora do bem único do fiador está expressa claramente na lei inquilinária.

De outro norte, o locador que entrou "no jogo" com a certeza de que conheceria as regras definidas pelo STF em sede de repercussão geral e assentada no tema 295, agora se vê a beira de novo julgamento que revisitará a questão, podendo assim mudar o seu entendimento.

E note-se, nem sequer o argumento retórico de que tal viabilidade de penhora usurparia o princípio da isonomia, pois ao fiador seria dado uma tratamento mais duro do que ao inquilino faz sentido nesse caso, afinal locatário e fiadores se confundem, que repisa-se é o mais corriqueiro no mercado. Difícil explicar à qualquer um, a lógica deste raciocínio.

Tal possibilidade é um verdadeiro contrassenso ao princípio da segurança jurídica e à própria finalidade do instituto da repercussão geral, ainda mais quando se sabe que o caso que gerou tal tema também, o que se chama de leading case, operou-se num caso de locação comercial.

Por fim, se bem-sucedida a empreitada dos fiadores para afastar a penhorabilidade de seu bem, milhares de outros locatários e pretendentes à locação, que preferem usar da fiança para garantir seus próprios negócios vez que a única modalidade gratuita, serão prejudicados.

Esta modalidade certamente não mais será aceita e haverá uma corrida para se exigir a substituição por garantias onerosas em nefasto período ainda afetado pela pandemia em que muitos comerciantes lutam diuturnamente pela manutenção e equilíbrio de seus negócios.

Vale acrescentar que a perda da propriedade dos fiadores em hasta pública não atinge 0,2% de todas as execuções neste mercado. Com a segurança imposta pelo tema 295 as negociações fluem e a dívida é adimplida.

Uma eventual mudança do entendimento, criando-se uma distinção da penhora de acordo com o objetivo da locação, não só criaria uma distinção (onde a lei não a prevê) como lançaria todo o mercado a impor outras garantias para a conquista da locação.

Assim, este julgamento não só abala o sistema jurídico e prejudica milhares de locatários que cumprem seus compromissos, mas afronta a "justiça do caso concreto". É preciso ter cuidado!

* Moira Regina de Toledo Bossolani é advogada, mestre em Direito Civil pela USP.

* Leandro Ibagy é empresário e advogado formado em 1988 na UFSC - especializado no Direito Imobiliário, diretor jurídico da Ibagy Imóveis Ltda.

Para adquirir LIVROS clique aqui…

Fonte: Lello (Assessoria de Imprensa)



Você conhece a origem dos seus direitos?

Advogado e professor Marco Túlio Elias Alves resgata a história do Direito no Brasil e no mundo em livro que democratiza os saberes jurídicos.

Autor: Divulgação


Os planos de saúde e os obstáculos ao bem-estar dos pacientes

No contexto do direito à saúde no Brasil, os planos de saúde privados são regulados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que estabelece normas e diretrizes para garantir a cobertura assistencial aos consumidores.

Autor: Natália Soriani


R$ 200 mil não apaga a dor, mas paga a conta

Um caso de erro médico do interior de São Paulo chamou atenção de todo Brasil por conta de dois fatores.

Autor: Thayan Fernando Ferreira


Precisamos mesmo de tantas leis?

O Direito surgiu como uma forma de organizar melhor as sociedades, uma vez que já havia algumas tradições reproduzidas a partir de exemplos ou de determinações orais que alguns grupos, especialmente os familiares, seguiam.

Autor: Marco Túlio Elias Alves


Proibição do chatbot na campanha eleitoral afeta políticos com menos recursos

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atualizou normas relacionadas ao uso da inteligência artificial nas campanhas para as eleições municipais de 2024. A alteração é vista como pequena e mal discutida por especialistas da área.

Autor: Divulgação


Digitalização da saúde e os desafios na relação plano e consumidor

A digitalização da saúde, que compreende o uso de recursos tecnológicos e de Tecnologia da Informação (TI) para fins médicos, é um fenômeno que a cada ano se consolida e expande em todo o país.

Autor: Natália Soriani


Os equívocos do caso Robinho

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no uso de competência constitucional e regimental, analisou e, por maioria de votos, homologou o pedido de execução da sentença penal condenatória proferida pela Justiça Italiana contra o ex-jogador Robinho.

Autor: Marcelo Aith


A nova lei de licitações: o que deve mudar daqui para frente?

O sucesso dessa legislação dependerá do compromisso de todas as partes envolvidas em trabalhar juntas.

Autor: Matheus Teodoro


Exclusão de dependentes maiores de 25 anos de planos de saúde

Os magistrados têm reconhecido a existência de uma expectativa de direito por parte dos consumidores.

Autor: José Santana Junior


TikTok e a multa milionária por captura ilegal de dados biométricos no Brasil

Por utilizar métodos que ferem a Lei Geral de Proteção de Dados e o Marco Civil da Internet, o TikTok, rede social famosa por vídeos de curta duração, foi multado em R$ 23 milhões pela Justiça.

Autor: Renato Falchet Guaracho


Como tornar o mundo jurídico descomplicado

A comunicação no mundo jurídico é uma das mais complicadas do mercado. Termos técnicos demais e palavras em latim, por exemplo, criam grandes obstáculos.

Autor: Gabriella Ibrahim


Por que a Meta deverá, obrigatoriamente, mudar de nome no Brasil?

A Meta, empresa dona dos aplicativos Facebook, Instagram e WhatsApp não poderá usar este nome no Brasil.

Autor: Renato Falchet Guaracho