Portal O Debate
Grupo WhatsApp

A CPI da Covid, o presidente, governadores, prefeitos e a Constituição/88

A CPI da Covid, o presidente, governadores, prefeitos e a Constituição/88

07/05/2021 Alexandre Aroeira Salles

É atordoante o grau de desinformação que boa parte classe política consegue gerar entorno dos mais variados temas. A chamada CPI da COVID-19 é apenas mais um.

O governo federal vem divulgando as somas de recursos enviados para os Estados, atestando o cumprimento da sua parte.

Governadores e prefeitos, por sua vez, alegam que não conseguiram fazer muito com o que receberam, a despeito das elevadas somas, e que ainda tiveram que lutar contra o exemplo de um presidente que negligencia a gravidade desse vírus. Quem tem razão?

Como não sou médico, restrinjo-me apenas à análise do tema sob a perspectiva jurídico-constitucional.

A CF/88, em seu artigo 21, diz que compete à União “planejar e promover a defesa contra as calamidades públicas”, assim como “elaborar e executar os planos nacionais (...) de desenvolvimento social”, e os serviços de navegação aérea, transporte interestadual e internacional de passageiros, mantendo relações com países estrangeiros.

Incumbe também à União (art. 22) legislar sobre as diretrizes da política nacional de transportes, política de crédito e requisições civil e militares em caso de iminente perigo.

Não obstante, é competência comum da União, dos Estados e dos Municípios (art. 23) cuidarem da saúde e assistência pública, cabendo aos Estados e à União (art. 24) legislarem sobre proteção e defesa da saúde, concernindo à União estabelecer normas gerais, e apenas na hipótese de sua omissão, podendo os Estados atenderem as suas peculiaridades (§ 3º, art. 24).

Por fim, vale lembrar que compete aos Município (art. 30) legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual no que couber.

A Constituição traz consigo uma lógica simples: tudo que envolva dois ou mais municípios é de competência do respectivo Estado Membro atuar; tudo que transborde as fronteiras de um ou mais Estados é de competência da União liderar; assim como aquilo que vem do exterior, é responsabilidade da União gerir.

O esperado constitucionalmente para o Brasil teria sido o Governo Federal, desde fevereiro de 2020, ter conseguido liderar um esforço nacional de proteção e combate ao COVID-19, promovendo diretrizes que minorassem os seus efeitos.

Tais diretrizes referem-se a competências de âmbito da União, tais como planos nacionais, transporte interestadual e internacional, relações internacionais e com organizações multilaterais, suprimentos nacionais e programa nacional de imunização.

Contudo, as omissões, falas e posturas do Presidente da República e do Ministério da Saúde trouxeram sérias dúvidas e enorme insegurança sobre suas eficácias na prevenção e controle do vírus, acarretando um salve-se quem puder, de modo que cada governador e prefeito passou a seguir suas fontes próprias de orientação, muitas vezes desencontradas e exageradas.

Para tanto, agarrados nas competências constitucionais comuns e concorrentes com a União, legislaram do modo que puderam, a ponto de municípios vizinhos e divididos por uma avenida estabelecerem decretos diferentes para abertura e fechamento de comércio. Não poderia dar certo mesmo.

O tumulto foi tão significativo que houve necessidade de o STF arbitrar o conflito instalado entre os entes federativos, decidindo que as orientações científicas internacionais relacionadas ao COVID-19 não estavam sendo seguidas pela União, denotando inação, o que acabava por autorizar os Estados e Municípios a cumprirem suas competências comuns de realização da saúde “amparada em evidências científicas” (ADI 6.341/DF).

É dessa confusão que se instalou que hoje ouvimos gritos por todos os lados, cada um colocando a culpa no outro, quando, na verdade, o que o Constituinte de 1988 tentou fazer foi organizar a República Federativa do Brasil entregando à União a responsabilidade de “planejar e promover a defesa contra as calamidades”.

Infelizmente o líder do Poder Executivo da União no período dessa pandemia não conseguiu encontrar forças intelectuais ou políticas para exercer o papel que se deveria dele juridicamente esperar: liderança.

Como se sabe, líder é aquele que consegue inspirar e motivar as pessoas a somarem seus esforços em prol de um bem comum, ultrapassando conjuntamente e em sinergia os obstáculos que se apresentam, atenuando os conflitos e encontrando os pontos focais do grupo.

Por meio de seus exemplos e palavras, o líder influencia e gera, com naturalidade, a confiança do time, cabendo-lhe reconhecer seus erros, ser convencido pelos liderados e ajustar o planejamento.

A CPI que agora se instaura deparará com os constitucionais dispositivos, incumbindo-lhe destrinchá-los, camada a camada, até chegar à inevitável conclusão da ausência de coesão nacional no momento histórico que o Brasil mais precisava.

O pior é que ainda precisamos desesperadamente de tal coesão, mas, pelo visto, estamos longe de consegui-lo.

* Alexandre Aroeira Salles é doutor em Direito e sócio fundador da Aroeira Salles Advogados.

Para mais informações sobre CPI clique aqui…

Publique seu texto em nosso site que o Google vai te achar!

Fonte: Digital Trix



O embate Twitter Files Brasil: que legado queremos deixar?

Elon Musk está usando sua plataforma X (ex-Twitter) para um duelo digital com o presidente do STF, Alexandre de Moraes.

Autor: Patrícia Peck


Justiça e inclusão: as leis para pessoas com TEA

Por muito tempo, os comportamentos típicos de crianças que tinham Transtorno do Espectro Autista (TEA) foram tratados como “frescura”, “pirraça” ou “falta de surra”.

Autor: Matheus Bessa e Priscila Perdigão


Você conhece a origem dos seus direitos?

Advogado e professor Marco Túlio Elias Alves resgata a história do Direito no Brasil e no mundo em livro que democratiza os saberes jurídicos.

Autor: Divulgação


Os planos de saúde e os obstáculos ao bem-estar dos pacientes

No contexto do direito à saúde no Brasil, os planos de saúde privados são regulados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que estabelece normas e diretrizes para garantir a cobertura assistencial aos consumidores.

Autor: Natália Soriani


R$ 200 mil não apaga a dor, mas paga a conta

Um caso de erro médico do interior de São Paulo chamou atenção de todo Brasil por conta de dois fatores.

Autor: Thayan Fernando Ferreira


Precisamos mesmo de tantas leis?

O Direito surgiu como uma forma de organizar melhor as sociedades, uma vez que já havia algumas tradições reproduzidas a partir de exemplos ou de determinações orais que alguns grupos, especialmente os familiares, seguiam.

Autor: Marco Túlio Elias Alves


Proibição do chatbot na campanha eleitoral afeta políticos com menos recursos

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atualizou normas relacionadas ao uso da inteligência artificial nas campanhas para as eleições municipais de 2024. A alteração é vista como pequena e mal discutida por especialistas da área.

Autor: Divulgação


Digitalização da saúde e os desafios na relação plano e consumidor

A digitalização da saúde, que compreende o uso de recursos tecnológicos e de Tecnologia da Informação (TI) para fins médicos, é um fenômeno que a cada ano se consolida e expande em todo o país.

Autor: Natália Soriani


Os equívocos do caso Robinho

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no uso de competência constitucional e regimental, analisou e, por maioria de votos, homologou o pedido de execução da sentença penal condenatória proferida pela Justiça Italiana contra o ex-jogador Robinho.

Autor: Marcelo Aith


A nova lei de licitações: o que deve mudar daqui para frente?

O sucesso dessa legislação dependerá do compromisso de todas as partes envolvidas em trabalhar juntas.

Autor: Matheus Teodoro


Exclusão de dependentes maiores de 25 anos de planos de saúde

Os magistrados têm reconhecido a existência de uma expectativa de direito por parte dos consumidores.

Autor: José Santana Junior


TikTok e a multa milionária por captura ilegal de dados biométricos no Brasil

Por utilizar métodos que ferem a Lei Geral de Proteção de Dados e o Marco Civil da Internet, o TikTok, rede social famosa por vídeos de curta duração, foi multado em R$ 23 milhões pela Justiça.

Autor: Renato Falchet Guaracho