Lição de civilidade
Lição de civilidade
Vivenciamos um fato de total desrespeito a um membro do poder judiciário protagonizado pelo presidente do Senado.
Depois do juiz da 10ª Vara da Justiça Federal determinar o cumprimento de mandado de busca e apreensão nas dependências do Senado Federal de matérias utilizados na contraespionagem, que segundo o entendimento esposado na decisão estava sendo utilizado para dificultar a investigações criminais contra senadores e a prisão de policiais legislativos, o senador Renan Calheiros, indignado com o decisum, partiu para o ataque pessoal contra o magistrado;
“...um juizeco de primeira instância não pode a qualquer momento atentar contra um poder. Busca e apreensão no senado somente com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e não por um juiz de primeira instância”
Por mais que entenda que a competência para tal ato seja da suprema corte e não do magistrado de primeiro grau, o ataque pessoal somente denigre a imagem do ofensor, clarificando seu destempero, ao desrespeitar um dos membros do poder judiciário por sua atuação judicante.
Decisões equivocadas combatem com recursos e não com acusações públicas, longe do foro competente. Por evidente que os magistrados (agentes políticos) e suas decisões estão sujeitos "a críticas", mas não ao desrespeito, principalmente, partindo de outra autoridade da República.
A ministra Cármem Lúcia, presidente do STF ao abrir a sessão do Conselho Nacional de Justiça, sem vituperar e citar o nome do senador, com a educação e discrição que lhes são peculiares, mas com a firmeza necessária manifestou na defesa do magistrado e do Poder Judiciário, ao dizer;
"Todas as vezes que um juiz é agredido, eu e cada um de nós juízes é agredido. E não há a menor necessidade de, numa convivência democrática, livre e harmônica, haver qualquer tipo de questionamento que não seja nos estreitos limites da constitucionalidade e da legalidade", afirmou a presidente do Supremo. (...) O que não é admissível aqui, fora dos autos, é que qualquer juiz seja diminuído ou desmoralizado. ”
A resposta da preclara presidente do Supremo Tribunal Federal, mais do que o amparo e solidariedade ao magistrado, foi uma aula de civilidade, de harmonia e independência dos poderes, prementes a democracia. Ao tomar conhecimento da fala da ministra Cármem Lúcia, o senador manteve a ausência de temperança e disse que não pode utilizar do aumentativo para tratar um juiz que usurpa função do STF e que faltou à reprimenda a devida repreensão.
O que se espera do presidente do senado ou qualquer outra autoridade é simplesmente sobriedade em seus atos e falas, a hostilidade demonstrada contra o magistrado não serve como recurso, levantando suspeitas de sua urbanidade ou excesso de preocupação com o material apreendido.
A nação não evolui culturalmente com a ofensa e o desrespeito. Caberia ao presidente do senado recorrer da decisão ou até mesmo, se entendesse ser o caso, propor representação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas nunca ultrajar a figura do magistrado.
* Bady Curi Neto é advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG).