Quando o trenó enfrentou chuva e lama para alegrar o menino
Quando o trenó enfrentou chuva e lama para alegrar o menino
Dezembro de 1962...
- Pai, eu vou querer uma bola de futebol no Natal. Será que se eu mandar uma carta para o Papai Noel, ele traz pra mim?
- Uai, filho, se você escrever acreditando de verdade, ele traz.
- Então vou escrever.
- Não esquece de colocar o endereço, pois muitas crianças estão pedindo presentes pra ele também. Sem o endereço ele vai ficar sem saber onde deixar. E coloca também o tipo de bola, tá?
- Vou querer uma bola de couro. Se ele não puder, pode ser de borracha mesmo. Só não quero muito pequena.
Aquele era um tempo em que sonho e realidade se misturavam em vários momentos na nossa cabeça de menino do interior. E a proximidade do Natal fazia com que muitas histórias fantásticas povoassem o nosso mundo infantil.
- E o carrinho de trenó dele anda na chuva? Tem muita lama na estrada que chega em Manga.
- Mas o trenó dele vem voando. Não tem perigo de atolar.
- Me falaram que ele entra pela chaminé e deixa os presentes da casa. Mas aqui na nossa casa não tem chaminé. Por onde o Papai Noel vai descer?
- Aqui vamos ter que deixar uma porta ou uma janela sem trancar, para que ele possa entrar.
- Vou ficar acordado esperando a chegada dele.
- Se você estiver acordado ele não entra. Ele só pode deixar o presente para quem estiver dormindo.
- Tá bom. Então vou escrever a minha cartinha pra ele.
No dia seguinte, após a aula no grupo escolar, apanhei uma folha de papel, o lápis e parti para minha missão:
"Querido Papai Noel.
Meu nome é Antônio Marcos Ferreira, mas todos me conhecem por Tonho. Alguns me chamam de Toninho também.
Estou escrevendo para o senhor porque estou com muita vontade de ganhar uma bola de futebol. Gosto muito de jogar bola e queria uma bola de capota para jogar pelada na rua.
Durante este ano eu estudei bastante, fiz todos os deveres que a minha professora passou e não desobedeci aos meus pais.
Não sei como esta carta vai chegar até o senhor, mas o meu pai disse que sabe como. Ele também disse que é um segredo e que não pode me falar. Confio muito nele, por isso vou entregar a carta e ele vai dar o jeito.
A cidade onde eu moro é muito longe da que o senhor mora, e as estradas são muito ruins. Mas o meu pai disse que o senhor vem de trenó. Só que vem voando, não é?
Melhor então. Para o senhor chegar direitinho e não perder o caminho, a minha cidade fica na beira do rio São Francisco. É um rio muito largo e o senhor vai ver logo.
A minha casa fica numa praça grande e tem uma mangueira bem na porta. Debaixo dela é que a gente brinca de bolinha de gude, finca, pião e outras brincadeiras.
A minha casa é da cor bege, com janelas verdes. O meu quarto fica na frente, mas eu durmo com dois irmãos no mesmo quarto. Então, para o senhor não ficar na dúvida, a minha cama é a que fica ao lado da janela e vou deixar meus sapatos lá.
Queria esperar o senhor acordado, mas o meu pai disse que se eu estiver acordado o senhor não vem, não é?
Espero que o senhor faça uma boa viagem e traga presentes para os meus irmãos e para os meus amigos também.
Um abraço!"
Meu pai tinha uma loja juntamente com a minha tia, e no mês de dezembro eles iam pra São Paulo comprar mercadorias, para aumentar as vendas na época do Natal.
No dia 24 de dezembro eu estava muito nervoso, pois chovia bastante e fiquei imaginando como é que o Papai Noel ia voar naquela chuva.
E também não podia deixar a porta destrancada para não molhar a casa. Fui dormir sem muita esperança de ganhar a minha bola.
Pois você acredita que, mesmo com aquela chuva toda, mesmo sem conseguir deixar a porta aberta, o Papai Noel veio, trouxe a minha bola de capota e quando acordei ela estava colocada em cima da minha cama?
Não acredita? É porque você não estava lá em Manga, na beira do rio, em dezembro de 1962!
* Antônio Marcos Ferreira