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A gênese da burocracia

A gênese da burocracia

13/10/2016 Vitor Maradei

A burocracia, na realidade, é um fenômeno que vai muito além da competência isolada de indivíduos.

Muitas vezes quando nos envolvemos em alguma trama burocrática, a primeira coisa que vem à cabeça é: “como alguém pôde inventar um conjunto de regras tão confuso e estúpido”.

Concluímos que isso é fruto da incompetência e anacronismo de algum agente público, ou ainda de uma dificuldade criada propositalmente para nos fazer reféns do sistema.

Teorias da conspiração à parte, a burocracia, na realidade, é um fenômeno que vai muito além da competência isolada de indivíduos. É um fenômeno social. Trata-se de um inesperado subproduto das disputas entre os diversos setores sociais e de suas boas intenções.

Bem, de boas intenções, sabemos que o inferno está cheio. Mas como segmentos sociais podem dar origem à burocracia? Tudo começa com uma lei. Democraticamente nossos representantes discutem no Congresso a aplicação de determinado tributo.

Os diversos setores sociais, com suas “boas intenções” tentam puxar a sardinha para o seu lado, propondo emendas com vantagens, limites e isenções para seu grupo. A fim de aprovar a lei é necessária muita negociação e inevitavelmente algumas emendas são aceitas, beneficiando este ou aquele segmento.

Isso por si só já torna a cobrança do tributo um tanto confusa, mas é só o começo. Aprovada a lei, é preciso regulamentá-la, ou seja, criar uma norma que orienta sua aplicação. A equipe técnica então se debruça sobre o texto legislativo, aplicando-lhe prazos, determinando como deverá ser pago o tal imposto, como calculá-lo e os documentos necessários para tal.

Nessa regulamentação, uma das preocupações é evitar que o contribuinte encontre um meio de “burlar a lei”. Para cada exceção, para cada emenda feita, é preciso buscar um meio de garantir que apenas as pessoas realmente beneficiadas tenham acesso às isenções aprovadas. Neste momento entram as exigências de documentos e mais documentos que comprovem o status do beneficiário e a essa altura o imbróglio está formado.

O medo da sonegação criou até a famigerada figura da substituição tributária em que o cliente é obrigado a recolher o imposto no lugar do vendedor ou prestador do serviço, descontando previamente do dinheiro que iria lhe pagar.

Os pobres contribuintes já têm diante de si um pequeno monstrengo para derrotar. Porém ainda há mais. Por mais eficientes que os legisladores e a equipe regulamentadora sejam, sempre haverá situações não previstas e frases ambíguas que impedem a interpretação inequívoca do texto legal.

Estas lacunas, demoram meses até serem normatizadas e, nesse meio tempo, é possível obter informações desencontradas, dando margem a recolhimentos indevidos e erros de toda sorte, mesmo por contadores experientes. O circo está formado, mas ainda vai se incendiar.

De posse deste calhamaço de informações, a equipe de informática deve “adaptar” o software existente para atender a nova lei. Normalmente trata-se de um software antigo já modificado diversas vezes e cheio de bugs tendo em vista a rápida evolução dos sistemas operacionais em que rodam.

Os técnicos lutam arduamente para destrinchar o texto legal e transformá-lo em linguagem de programação, mas fatalmente nos primeiros meses de implantação, problemas irão aparecer, gerando dificuldades para toda a rede.

Assim o monstrengo agora, tornou-se cibernético. Mas ele ainda ficará mais terrível. Como o responsável em última instância pelas informações prestadas é o contribuinte, o sistema precisa deixar em aberto vários campos que, ao serem preenchidos, irão ou não encaixá-lo nas tais exceções e isenções.

O contribuinte, porém, só saberia responder estes campos se tivesse lido toda a Lei e as instruções normativas a ela agregadas. Obviamente ele não fez isso, mas espera que seu contador o tenha. Ocorre que seu contador tem centenas de clientes, cada com suas peculiaridades e muitas vezes não dá conta de pesquisar a situação de cada um, especialmente se a remuneração combinada for pequena, como geralmente ocorre.

Para tentar resolver rapidamente o problema de seu cliente, recorre então ao “Manual” do programa. Em vão. Os manuais via de regra são intrincados incompletos e confusos. Para não correr riscos, muitos contadoras acabam optando por enquadrar o cliente na alíquota mais alta, assim é certo que a Receita Federal não virá atrás.

Depois de brigar com seu contador, desesperado, sem saber como recolher o imposto, o contribuinte resolve se dirigir pessoalmente ao órgão competente para elucidar sua dúvida. Para isso ele precisa primeiro descobrir qual o órgão competente, depois agendar uma visita.

Chegando ao departamento, ele irá se deparar com um atendente que não foi atualizado para as mudanças da lei e quando o foi, recebeu um treinamento de alguns dias, uma cópia daquele mesmo manual e pronto. Para o atendente, a primeira dificuldade é entender a dúvida do contribuinte, pois este também, muitas vezes tem dificuldade em se explicar.

Como não tem elementos para responder com propriedade, simplesmente repetirá a resposta obscura do manual e só lhe restará repeti-la diversas vezes, com impaciência crescente, até que o contribuinte se sinta impelido a dizer que entendeu.

Se ao final de tudo, o contribuinte tiver sucesso em sua empreitada, ele teve que juntar uma série de documentos para comprovar que se enquadra nas exigências da lei e não está tentando burlá-la, mas parecerá que foi algum burocrata chato que exigiu.

Vai gerar a guia de pagamento em um software cheio de bugs e com campos misteriosos e pensará que o programador é um louco, embora na verdade os campos sejam obrigatórios para que o contribuinte se responsabilize pelas informações prestadas, e finalmente achará que o atendente para quem entregou a papelada é um preguiçoso e antipático, mas na verdade ele simplesmente não teve o treinamento adequado para lhe fornecer a informação solicitada.

Como se vê, explicar a burocracia é também um processo altamente burocrático e seus tentáculos muito mais longos do que parecem. O segredo para saná-la são leis simples e genéricas, mais confiança no contribuinte, investimentos em informática e treinamento.

Nesse sentido nossos legisladores tem um papel fundamental. Uma lei fácil de cumprir beneficia indistintamente todos os segmentos, cortando o mal pela raiz.

* Vitor Maradei é CEO do site Contador Amigo, plataforma composta de tutoriais e aplicativos que permite ao microempresário cuidar sozinho de suas obrigações fiscais, de maneira rápida e fácil.



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