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A Fita Branca

A Fita Branca

02/06/2020 Daniel Medeiros

Em março de 1963, um ano antes do golpe que defenestrou o governo populista de João Goulart, houve um episódio que já anunciava, sem ranhuras, o que estava por vir.

Mas ninguém, com exceção de um ou outro intelectual, prestou a devida atenção.

O deputado Dirceu Cardoso, do PSD do Espírito Santo, exigiu a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a ocorrência de fatos que, segundo ele, atentavam contra as instituições democráticas.

Fatos de clara orientação comunista. Tratava-se da obra A mulher do Vizinho, do escritor mineiro Fernando Sabino, adotada nas escolas públicas de Brasília para jovens da quarta série do ginásio (equivalente ao nosso nono ano), “com o dinheiro de todo o povo brasileiro”, como enfatizou o deputado na tribuna da Câmara.

E para provar sua tese, leu uma das crônicas do livro, chamada “mata-borrão”, na qual, segundo ele, “a figura de um deputado é apresentada descaracterizada, como ladrão de uma mesa, de uma cadeira e de uma máquina de escrever”.

Também “denunciou” a crônica “Lar, doce Lar”, que narra a história de um marido infeliz no casamento. “Livros amorais”, sentenciou o deputado.

Três dias depois, no dia 31 de março, exatamente um ano antes do golpe civil - militar que impôs o mais longo período autoritário da história do país, Carlos Drummond de Andrade rebateu a denúncia do deputado com uma crônica primorosa, chamada “As mulheres do Vizinho”, publicada no jornal Correio da Manhã.

Nela, com fina ironia, Drummond diz que não sabe mais distinguir nada com nada: “os homens andam de costas, as tartarugas de patins, as casas são construídas com o teto para baixo, Minas é um Estado marítimo…e os comunistas vão à missa”.

E, para comprovar, arremata: “lá vem saindo da igrejinha o escritor Fernando Sabino, o autor comunista do livro que envenena a mente de garotos de catorze anos em Brasília”

Drummond, então, revela que o escritor - já reconhecido internacionalmente pelo magnífico romance O Encontro Marcado - era um caprichoso maquiavélico, pois em vez de ter escrito um livro chamado A mulher do Vizinho, na verdade, escreveu dois:

“Um é de crônicas sobre o cotidiano, e pode ser lido por qualquer pessoa, sem ofensa a princípios morais e cívicos; até mesmo inspira simpatia, benevolência e piedade em face da condição humana, em certas páginas. O outro é explosivo e destrói as nascentes mais puras do coração. Um reflete a experiência do escritor como pai, e conta histórias deliciosas de crianças, que encantam a qualquer cristão; o outro descreve cenas orgíacas entre tarados, e enxovalha os poderes constituídos, açula na criança o desejo de matar e roubar, faz misérias. Os menores convertidos em facínoras, que hoje lançam o terror à população, embora não frequentem ginásios, devem ter haurido estímulo nessa obra deletéria”.

E continua, deliciando-se com a bizarrice da situação imaginada: “o primeiro livro não somente pode como merece ser utilizado para o ensino de português a meninos de catorze anos, que a par da graça dos casos encontrados nele, a surpresa de uma linguagem viva, saborosa, direta (…) já o segundo, meu Deus…”

E conclui o poeta: “A Mulher do Vizinho que eu li é a versão luminosa do livro de Sabino. A Mulher do Vizinho que o deputado encontrou nos ginásios de Brasília, é a versão diabólica. E logo esta que foi escolhida pelos educadores! Eis aí: a Comissão Parlamentar de Inquérito vai apurar que há duas mulheres do vizinho, ou, por outra, que o vizinho tem duas mulheres”, arrematou o grande Drummond, com o sarcasmo que é a única arma possível contra a burrice.

Sei que seria fácil falar agora algo assim: olha tudo aí acontecendo de novo. Mas não. Vou me conter e apenas me limitarei a dizer: olha tudo aí acontecendo de novo.

* Daniel Medeiros é doutor em Educação Histórica e professor no Curso Positivo.

Fonte: Central Press



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