A Venezuela sem Chávez
A Venezuela sem Chávez
A morte de Hugo Chávez expõe ao mundo, mais uma vez, o já infeliz e consagrado jeito latino-americano de fazer política, calcado na figura de um personagem posado como salvador da pátria, e não sobre um programa de governo.
A Venezuela vive hoje a mesma comoção que já viveram argentinos por Evita e Perón, brasileiros por Vargas e Tancredo e outros povos da região por seus líderes mortos. Respeitadas as diferenças de tempo e lugar, é apenas uma “avant-première” do que se dará no dia em que morrer o octogenário Fidel Castro, apenas com a diferença de que o líder cubano deixará um número maior de viúvas políticas e ideológicas, já que exportou a sua inviável revolução durante cinco décadas.
O polêmico Chávez surgiu no cenário político ao tentar um golpe de estado. Passou algum tempo na cadeia e, anistiado, entrou para a política e conseguiu falar a língua do povo. Governou por 14 anos o seu país, rico em petróleo e carente em produção de alimentos e manufaturados. Promoveu a redistribuição de renda, com programas sociais que hoje se alastram para outros países, inclusive o Brasil, mas não conseguiu atrair investimentos economicamente produtivos.
Ninguém, a essa altura, é capaz de prever com segurança, o que será da Venezuela e do chavismo sem Chávez. Em 30 dias ocorrerá a eleição do novo presidente. Resta saber se o eleito conseguirá estabelecer a governabilidade num pais cuja legislação e instituições foram moldadas para o manejo pessoal do líder morto.
Enquanto chefes de Estado, simpatizantes e o povo desfilam no concorrido velório e sepultamento, as forças políticas de Caracas estarão buscando as difíceis equações do momento. O país vive a crítica encruzilhada entre o certo e o duvidoso, o bom e o ruim, o lógico e o ilógico. E, apesar de todas as opiniões e solidariedade externas, isso só cabe aos próprios venezuelanos decidir e, logicamente, pagar o preço da decisão.
Tida durante muito tempo como “quintal” das grandes potências, a América Latina é sofrida por não ter uma cultura política sólida. Tudo aqui se faz na passionalidade e no improviso. Raramente os planos de governo sobrevivem no mandato seguinte. Independente do viés ideológico, personaliza-se governantes e líderes e enfraquece-se o Estado, quando deveria se fazer o contrário.
Se o Estado fosse mantido forte, não teríamos vivido tantos golpes e cada nação do continente certamente já teria encontrado a sua vocação e o caminho mais indicado para o desenvolvimento. Ultimamente os golpes militares estão fora de moda, mas a sociedade é golpeada pela corrupção e até pelos golpes político-parlamentares, desfechados em nome da democracia. Para nós, brasileiros, a Venezuela, além de vizinha, amiga é excelente parceira comercial.
Temos de torcer para que encontre o seu rumo e tanto esse país, quando os outros da área, sejam capazes de estabelecer o Estado, que é permanente, mais forte do que a figura dos governantes, que são efêmeros. Só assim, todos nós, um dia, deixaremos de ser incomodamente vistos como “repúblicas de bananas”...
*Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).