Portal O Debate
Grupo WhatsApp

Os riscos do homeschooling para a educação básica no Brasil

Os riscos do homeschooling para a educação básica no Brasil

30/05/2022 Leandro Madureira

O homeschooling ou ensino domiciliar é uma modalidade que se pretende aplicar na educação básica do Brasil.

Hoje, o ensino é realizado no ambiente escolar, dentro das escolas e dos colégios, em uma coparticipação de responsabilidades entre União, Estado, Distrito Federal e Municípios. A União tem competência para legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional, enquanto aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, além da própria União, compete proporcionar a forma de acesso à educação.

Assim, cada ente federativo tem sua responsabilidade na administração desse ensino. E, apesar de possuir uma série de problemas e dificuldades, sobretudo pela ausência de investimento e falta de valorização dos profissionais de educação, o ensino escolar cumpre muito mais do que função meramente de transmissão de conhecimento.

O ensino escolar cumpre uma função cidadã, de formação do aluno para a sociedade, tendo em vista que é nesse ambiente escolar que o aluno exerce suas relações sociais iniciais. É dentro desse ambiente que as amizades se estabelecem, que a criança, o adolescente, o jovem tem a capacidade de exercer uma série de outras atividades que não adstritas à sala de aula e que serão fundamentais para seu desenvolvimento enquanto pessoa, enquanto ser humano, enquanto profissional no futuro.

É no ambiente escolar que se aprende a exercer a relação social inicial pela troca de informações com os colegas, de informações com os professores e professoras. Na relação que existe no âmbito interno da escola, o aluno se prepara para enfrentar o mercado de trabalho no futuro, onde ele também precisará lidar com pessoas, no seu ambiente de trabalho, também precisará estabelecer relações de amizade, de hierarquia, de obediência e disciplina.

O ambiente escolar traz uma formação humana que vai além do conhecimento, vai além do ensino meramente burocrático, do ensino que tem relação com conteúdo, pois permite de fato o desenvolvimento do aluno como cidadão do futuro.

Já o ensino domiciliar é uma outra modalidade de relação com o ensino. O ensino domiciliar aplicado na educação básica é realizado eminentemente, ou pretende ser realizado eminentemente, dentro do ambiente domiciliar. E esse tolhimento do convívio social tende a ser bastante prejudicial para o aluno, para a criança que está em formação.

O ambiente domiciliar muitas vezes pode oferecer uma série de riscos que o ambiente escolar elimina ou permite a identificação desses riscos. Nós temos um quadro de violência contra a criança e contra o adolescente no nosso país que é muito preocupante.

A criança e o adolescente são vítimas de violência de toda ordem, seja física, psicológica e sexual. Há uma série de tipos de violências das quais as crianças e adolescentes são vítimas, que, muitas vezes, só são identificadas no ambiente escolar. Os professores, sobretudo na educação básica, possuem a competência de identificar que o aluno sofreu algum tipo de abuso.

E não nos deixemos enganar: a realidade deixa claro que boa parte dos assediadores sexuais contra crianças e adolescentes são pessoas que fazem parte de um convívio íntimo da família, seja um tio, um padrinho, um primo. Não é incomum também identificarmos em nossas redes sociais notícias de abusos cometidos por pessoas ainda mais próximas, como padrastos, namorados, avôs, que deveriam zelar pela proteção das crianças e adolescentes.

A comunidade escolar e o ensino presencial na educação básica têm um papel fundamental de reconhecer e denunciar que a criança ou o jovem está sendo vítima de algum tipo de violência. A criança vítima de abuso pode ter alguma mudança de comportamento que permite que as pessoas que fazem parte da comunidade escolar identifiquem o problema e deem o direcionamento necessário junto aos conselhos tutelares e a segurança pública.

A violência domiciliar é de difícil evidência justamente porque relacionada a um contexto protegido e inviolável, contra pessoas que estão em formação e que se veem traumatizadas pelo cometimento do delito. Fora do ambiente escolar, essas crianças ficarão ainda mais vulneráveis a uma realidade que se sobrepõe à defesa daqueles que desejam instituir o ensino domiciliar.

O ambiente escolar também permite que, dentro de uma realidade social cruel em que a fome e a miséria são presentes, o aluno realize suas refeições básicas. Não é raro que o desemprego empurre as famílias a uma realidade de pobreza alimentar e nutricional, que para crianças e adolescentes que estão em formação pode gerar uma fragilidade da saúde ainda maior. A escola e o ensino presencial permitem que o aluno realize uma ou mais refeições que, para aquela pessoa, será a única de todo um dia.

O ensino domiciliar, por outro lado, poderá ser utilizado, inclusive, para forçar essas crianças e adolescentes a realizarem atividade profissional precoce. É que ausentes do ambiente escolar, eles poderão ser incentivados a trabalhar, para ajudar no orçamento familiar.

Se mesmo com a escola presencial e obrigatória vemos as ruas repletas de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, exercendo venda informal nos semáforos das grandes cidades, o ensino domiciliar favorecerá a utilização da mão de obra infantil para o sustento da família.

A proposta do ensino domiciliar traz uma série de incertezas e uma serie de riscos que precisam ser muito bem avaliadas no Senado. O texto foi aprovado na Câmara dos Deputados e agora segue para análise dos senadores e senadoras.

A tendência é que o ensino domiciliar gere uma precarização ainda maior da educação brasileira. O homeschooling faz parte de uma bandeira defendida por uma corrente ideológica conservadora que pretende excluir essas crianças do ambiente escolar.

A principal alegação é a de que as crianças possuem um ensino que não condiz com a educação promovida pela família, que estão obtendo uma formação tendente a algum tipo de corrente ideológica, quando na verdade o homeschooling é a expressão maior desse tipo da ideologização da educação.

Portanto, é necessário que o Senado Federal, ao analisar esse projeto, tenha um olhar muito atento, um olhar desconectado daquilo que propaga o Governo Federal, um olhar desconectado das correntes conservadoras que defendem o homeschooling e que possam fazer uma análise com o foco na criança e na proteção integral da criança, que é uma determinação constitucional.

É essencial que os senadores percebam os riscos que o homeschooling traz e percebam a dificuldade que seria a implantação de um ensino domiciliar em um país tão complexo, tão cheio de dificuldades e de diferenças sociais.

O ensino escolar é a modalidade mais adequada para a formação das crianças e dos adolescentes no Brasil e mudar esse rumo, neste momento em que já estamos enxergando os prejuízos educacionais provocados pela pandemia, seria um grande risco de colocar a educação brasileiro em um grande abismo.

* Leandro Madureira é advogado, sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados, especialista em Direito Previdenciário e especialista em Políticas Públicas, Infância, Juventude e Diversidade pela UNB.

Para mais informações sobre homeschooling clique aqui…

Publique seu texto em nosso site que o Google vai te achar!

Fonte: Ex-Libris Comunicação Integrada



Michael Shellenberger expôs que o rei está nu

Existe um ditado que diz: “não é possível comer o bolo e tê-lo.”

Autor: Roberto Rachewsky


Liberdade política sem liberdade econômica é ilusão

O filósofo, cientista político e escritor norte-americano John Kenneth Galbraith (1908-2006), um dos mais influentes economistas liberais do Século XX, imortalizou um pensamento que merece ser revivido no Brasil de hoje.

Autor: Samuel Hanan


Da varíola ao mercúrio, a extinção indígena persiste

Os nativos brasileiros perderam a guerra contra os portugueses, principalmente por causa da alta mortalidade das doenças que vieram nos navios.

Autor: Víktor Waewell


A importância de uma economia ajustada e em rota de crescimento

Não é segredo para ninguém e temos defendido há anos que um parque industrial mais novo, que suporte um processo de neoindustrialização, é capaz de produzir mais e melhor, incrementando a produtividade da economia como um todo, com menor consumo de energia e melhor sustentabilidade.

Autor: Gino Paulucci Jr.


O fim da excessiva judicialização da política

O projeto também propõe diminuir as decisões monocráticas do STF ao mínimo indispensável.

Autor: Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves


O inesperado e o sem precedentes

Na segunda-feira, 1º de abril, supostos aviões militares de Israel bombardearam o consulado iraniano em Damasco, na Síria.

Autor: João Alfredo Lopes Nyegray


Crédito consignado e mais um golpe de milhões de reais

No mundo das fraudes financeiras, é sabido que os mais diversos métodos de operação são utilizados para o mesmo objetivo: atrair o maior número possível de vítimas e o máximo volume de dinheiro delas.

Autor: Jorge Calazans


Quando resistir não é a solução

Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, fundador da psicologia analítica, nos lembra que tudo a que resistimos, persiste.

Autor: Renata Nascimento


Um olhar cuidadoso para o universo do trabalho

A atividade laboral faz parte da vida dos seres humanos desde sua existência, seja na forma mais artesanal, seja na industrial.

Autor: Kethe de Oliveira Souza


Imprensa e inquietação

A palavra imprensa tem origem na prensa, máquina usada para imprimir jornais.

Autor: Benedicto Ismael Camargo Dutra


Violência não letal: um mal silencioso

A violência não letal, aquela que não culmina em morte, não para de crescer no Brasil.

Autor: Melissa Paula


Melhor ser disciplinado que motivado

A falta de produtividade, problema tão comum entre as equipes e os líderes, está ligada ao esforço sem alavanca, sem um impulsionador.

Autor: Paulo de Vilhena