Portal O Debate
Grupo WhatsApp

O “Lado B” da delação premiada

O “Lado B” da delação premiada

25/09/2017 Euro Bento Maciel Filho

Era evidente que, em algum momento, a “delação premiada” iria revelar o seu lado obscuro.

O “Lado B” da delação premiada

Embora não seja novo no nosso Direito, é fato que o instituto da “delação premiada” passou a ser muito utilizado somente após a regulamentação que lhe foi dada pela Lei 12850/2013. Atualmente, não são poucos os que o consideram como uma indispensável ferramenta de investigação e de combate ao crime pelo Estado.

Há um sentimento comum de que as incontáveis operações da Polícia Federal (e, principalmente, a “Lava-Jato”) não teriam chegado aos resultados que alcançaram sem a “colaboração” dos inúmeros delatores que apareceram de uns tempos para cá. Realmente, é inegável que o combate à corrupção que assola o país teve na “colaboração premiada” um importantíssimo aliado.

Afinal, foi por conta das delações que, paulatinamente, de um lado, o Estado brasileiro conseguiu recuperar bilhões de reais que tinham sido desviados dos cofres públicos e, de outro, a sociedade passou a presenciar figurões do “alto escalão” político e grandes empresários sendo encarcerados e processados criminalmente. Em meio aquele sentimento inicial de euforia e satisfação, a sociedade brasileira, cansada da folia feita com o dinheiro público, a tudo aplaudiu.

Contudo, paralelamente aos aplausos e às sucessivas operações da Polícia Federal, a legalidade, o respeito irrestrito à Constituição e, principalmente, os direitos e garantias constitucionais dos investigados acabaram ficando em um segundo plano. Afinal, por conta da sanha punitivista que domina o espírito da nossa sociedade, o interesse do “coletivo” passou a ser mais importante do que a defesa dos direitos processuais dos envolvidos.

De toda forma, enquanto as delações alcançavam os seus fins, produzindo heróis e vilões, tudo era festa. Entretanto, na esteira do que alguns operadores do Direito já alertavam ao tempo em que as delações pululavam pelo país, sempre é preciso ter cuidado com aquilo que falam os “réus colaboradores”, afinal, como bem se sabe, quem delata é tão “criminoso” quanto os delatados.

Dentro desse quadro de ideias, até que ponto poder-se-ia emprestar plena e total confiança às delações? Era evidente que, em algum momento, a “delação premiada” iria revelar o seu lado obscuro, até então desconhecido.

De fato, sobretudo a partir do instante em que empresários de um grande conglomerado industrial, porque resolveram delatar e cooperar com a apuração de crimes que envolviam o alto escalão da República, viram-se livres e integralmente perdoados de todos os seus ilícitos, aquela mesma sociedade que a tudo aplaudia, já não conseguiu mais compreender o que estava se passando.

Ao cabo de contas, como entender que réus confessos, supostamente envolvidos com inúmeras práticas delituosas, simplesmente conseguiram uma autorização para deixar o País, como se nada devessem às autoridades e à Justiça? Nesse instante, a “delação premiada”, antes tida como poderoso instrumento de investigação, passou a ser tratada como uma possível fonte de impunidade.

Esqueceram-se os críticos, porém, que aquele acordo foi realizado dentro dos estritos limites da lei, tanto que acabou sendo integralmente homologado pelo STF. Aqui, é preciso dizer que o tamanho do benefício concedido ao delator está intimamente relacionado ou à magnitude dos crimes por ele revelados ou, então, à importância dos delatados no cenário político/econômico nacional.

Se assim o é, forçoso reconhecer que, em virtude das informações, fatos e provas inicialmente apresentadas, o “perdão” concedido para aqueles grandes empresários não tinha nada de anormal, nem, tampouco, de ilícito. De toda forma, aquele acordo, embora formalmente lícito, foi muito útil para mostrar à sociedade o “lado B” da “delação premiada”, vale dizer, a faceta obscura e negativa daquele instituto.

Ficou comprovado, portanto, que, tal qual se dá no Direito Americano, a mesma delação, que justifica a prisão de diversos investigados, é também capaz de motivar a concessão de um “perdão integral” a quem comete crimes, vale dizer, promover a impunidade do delator. Entretanto, é bom dizer que, recentemente, esse “lado B” ganhou cores ainda mais vivas.

Com efeito, por conta de uma gravação altamente comprometedora, cujo conteúdo atinge importantes Instituições e personagens da Nação, aqueles “delatores”, até então imunes à aplicação da lei, caíram em desgraça. Apesar do tom “bravateiro” daquela conversa, está claro que ela atinge pessoas importantes, bem como joga terra por cima de integrantes do MPF.

Foi a partir daí, portanto, que o Estado passou a promover uma clara tentativa de calar o “delator”, até então tido como “intocável”, para assim evitar que possíveis bravatas ganhassem força e produzissem efeitos explosivos no seio do poder. Mais do que depressa, o “colaborador” até então “protegido” foi encarcerado, jogado aos leões da mídia e da opinião pública e, agora, a delação premiada por ele celebrada está em xeque, já que, caso seja anulada, perderá todos os benefícios que lhe haviam sido “prometidos”.

Seria realmente aceitável tamanha reviravolta? Afinal, foi o “delator” quem quebrou as regras do acordo de delação e, por isso, merece perder as benesses que lhe foram prometidas, ou, então, é o Estado que está se aproveitando de uma “brecha”, verdadeiro deslize, para justificar a imediata anulação do acordo? Só o tempo, e o STF, é que nos responderá.

* Euro Bento Maciel Filho é advogado e professor de Direito Penal e Processo Penal, mestre em Direito Penal pela PUC-SP e sócio do escritório Euro Filho Advogados Associados.



Nem Nem: retratos do Brasil

Um recente relatório da OCDE coloca o Brasil em segundo lugar entre os países com maior número de jovens que não trabalham e nem estudam.

Autor: Daniel Medeiros


Michael Shellenberger expôs que o rei está nu

Existe um ditado que diz: “não é possível comer o bolo e tê-lo.”

Autor: Roberto Rachewsky


Liberdade política sem liberdade econômica é ilusão

O filósofo, cientista político e escritor norte-americano John Kenneth Galbraith (1908-2006), um dos mais influentes economistas liberais do Século XX, imortalizou um pensamento que merece ser revivido no Brasil de hoje.

Autor: Samuel Hanan


Da varíola ao mercúrio, a extinção indígena persiste

Os nativos brasileiros perderam a guerra contra os portugueses, principalmente por causa da alta mortalidade das doenças que vieram nos navios.

Autor: Víktor Waewell


A importância de uma economia ajustada e em rota de crescimento

Não é segredo para ninguém e temos defendido há anos que um parque industrial mais novo, que suporte um processo de neoindustrialização, é capaz de produzir mais e melhor, incrementando a produtividade da economia como um todo, com menor consumo de energia e melhor sustentabilidade.

Autor: Gino Paulucci Jr.


O fim da excessiva judicialização da política

O projeto também propõe diminuir as decisões monocráticas do STF ao mínimo indispensável.

Autor: Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves


O inesperado e o sem precedentes

Na segunda-feira, 1º de abril, supostos aviões militares de Israel bombardearam o consulado iraniano em Damasco, na Síria.

Autor: João Alfredo Lopes Nyegray


Crédito consignado e mais um golpe de milhões de reais

No mundo das fraudes financeiras, é sabido que os mais diversos métodos de operação são utilizados para o mesmo objetivo: atrair o maior número possível de vítimas e o máximo volume de dinheiro delas.

Autor: Jorge Calazans


Quando resistir não é a solução

Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, fundador da psicologia analítica, nos lembra que tudo a que resistimos, persiste.

Autor: Renata Nascimento


Um olhar cuidadoso para o universo do trabalho

A atividade laboral faz parte da vida dos seres humanos desde sua existência, seja na forma mais artesanal, seja na industrial.

Autor: Kethe de Oliveira Souza


Imprensa e inquietação

A palavra imprensa tem origem na prensa, máquina usada para imprimir jornais.

Autor: Benedicto Ismael Camargo Dutra


Violência não letal: um mal silencioso

A violência não letal, aquela que não culmina em morte, não para de crescer no Brasil.

Autor: Melissa Paula